Acerca das Novas Formas de
Trabalho em Portugal: Uma Perspectiva Sócio-Organizacional
e Jurídica |
Na "introdução" da nossa apresentação, é
caracterizada a envolvente do fenómeno da precariedade em
Portugal, considerando a sua integração enquanto estado-membro
da União Europeia (UE).
Perante a rigidez de mercado que é cada vez mais evidenciada
pela competitividade do mercado mundial, analisaremos a excessiva
regulamentação laboral como um dos eventuais grandes causadores
do desemprego, na medida em que não permite a mobilidade laboral
necessária ao mercado de trabalho actual. Reflectiremos sobre o
reverso desta situação, isto é o espectro do agravamento dos
conflitos sociais entre os que têm emprego certo e os que
trabalham em regime de trabalho precário.
A mudança brusca de uma situação de expansão económica, e de
quase pleno emprego, para uma outra de recessão e de desemprego,
particularmente na UE e em Portugal, levou à procura de
respostas que, para autores neo-liberais, passam pela abolição
do status-quo vigente em matéria de leis do trabalho e pela adopção
de uma política de flexibilização das mesmas.
A tendência para a flexibilização das leis do trabalho
acompanha esses pressupostos, assentando na ideia de que a
rigidez das leis do trabalho não serve - a não ser no imediato
- aos referidos trabalhadores empregados, uma vez que a garantia
de segurança no emprego é necessariamente limitada pela
possibilidade de emprego. A flexibilidade tornou-se a chave das técnicas
de gestão. As empresas mantêm o que é vital para a operação:
sempre que possível, utilizam menos quadros fixos e recorrem a
profissionais temporários ou prestadores externos de serviços.
Em Portugal, a partir de 1989, a evolução legislativa tende a
acompanhar uma tendência europeia de flexibilização jurídico-laboral,
pelo que a garantia da segurança no emprego tem sido alvo de
variadas críticas ao longo dos últimos anos, por parte de
certas correntes de pensamento de cariz neo-liberal
caracterizadas, essencialmente, pelas suas posições
anti-intervencionistas e defensoras do mercado como único
regulador da vida económica e social.
A solidez das empresas acompanha, naturalmente, a segurança no
emprego e o grau de adaptabilidade dos trabalhadores às novas
tecnologias. Dadas as transformações tecnológicas ocorridas, o
princípio da estabilidade no emprego vem sendo substituído pelo
da continuidade no emprego.
Deste modo, não se pode continuar a teorizar a garantia de
emprego apenas como a garantia da estabilidade dos trabalhadores;
é preciso introduzir um certo elemento de reflexão: a economia
portuguesa está inserida num espaço aberto como a União
Europeia, vivendo num mundo concorrencial. Caberá aqui reflectir
sobre o espírito de um novo Direito do Trabalho, em que se
conciliem duas necessidades antagónicas: evitar o dumping social
pela via da flexibilização e desregulamentação, e aceitar
como factor de competitividade a disponibilidade da força de
trabalho.
Face às exigências da competição global e das inovações
tecnológicas da década de 90, a palavra de ordem tem sido a de
continuar a concentrar as operações e reduzir pessoal, mesmo em
empresas com boa saúde financeira. A redução de pessoal é,
também, reforçada por inovações tecnológicas e pelo aumento
de produtividade . Fala-se em desemprego tecnológico, resultante
da introdução de novas tecnologias que utilizam menos mão-de-obra,
ou da recessão de actividades sujeitas à concorrência de
produtos baseados naquelas novas tecnologias. Embora a
estabilidade seja, hoje, um bem protegido, a flexibilização da
legislação laboral, nomeadamente a nível da cessação do
contrato de trabalho, está a perder sucessivamente o seu carácter
excepcional .
No segundo ponto desta apresentação - "Que futuro para o
Trabalho na UE?" - referiremos alguns dados recentes
relativos à EU, no que se refere ao desemprego e à criação de
empregos. Continuaremos abordando as tendências de ajustamento
do mercado do trabalho que transformaram em grande parte a concepção
e as exigências do mercado no domínio do emprego.
No sentido de criar uma nova estratégia de emprego, a UE tende a
encorajar a criação de postos de trabalho, modificando as
legislações nacionais que regulam o mercado de trabalho a fim
de que a maior flexibilidade dos mercados de bens e serviços
encontre a sua contrapartida numa maior flexibilidade do emprego.
Em suma, na Europa, o aumento do crescimento do emprego deve
passar por uma melhor repartição do trabalho existente, com a
instituição de um regime de trabalho a tempo parcial assistido
de um subsídio que compense parcialmente a perda de rendimento;
assegurando uma melhor repartição do trabalho, mas com a
garantia de regresso ao emprego no final desta interrupção; ou
ainda, com o desenvolvimento de empregos a tempo parcial numa
base voluntária (acompanhada da redução dos períodos de
trabalho, diários ou semanais, ou de períodos de trabalho
alargados ao longo do ano).
No terceiro ponto, subordinado ao título - "Portugal: do
desemprego à precariedade" - faremos um enquadramento da
evolução do emprego entre 1990 e 1995. Após caracterização
da década de 90, perspectivaremos um acentuar da precarização
do vínculo jurídico-laboral. Os anos 90 parecem mostrar que os
sintomas de que a UE sofria se farão sentir igualmente em
Portugal: o ritmo de expansão económica já não será tão
pujante como o foi na década de 80, o qual também já não fora
como o da década de 70 e que explica, de alguma forma, a
dificuldade de absorção do desemprego.
No que respeita à contratação precária, caracterizamo-la como
um fenómeno complexo, económico e social, que surge como
resposta a esta crise. Este sugere, na verdade, a ideia de
emprego transitório, instável, inseguro, ou seja, a ideia de
alto risco ou da elevada probabilidade de o trabalhador vir a
engrossar, a curto prazo, a fileira dos desempregados.
O progresso técnico e científico tal como, embora em menor
medida, a concorrência dos países com baixos salários, tendem
a excluir do mercado de trabalho uma parte da população, cujo nível
de qualificação é muito fraco em relação ao custo dessa mão-de-obra.
Nesse sentido, é absolutamente indispensável uma abordagem
estratégica europeia global, que deverá conduzir à criação
de um quadro de referência europeu, com base no qual poderá ser
elaborada uma estratégia plurianual a favor do emprego.
Nos últimos anos assistiu-se, em Portugal, a um aumento do número
de trabalhadores por conta própria, acompanhado de uma diminuição
sistemática e mais pronunciada do emprego por conta de outrem, e
ainda, a uma variação positiva do trabalho a tempo parcial, dos
contratos a termo e dos contratos de trabalho temporário. Estas
novas formas de trabalho de carácter que, não estão, na sua
maioria, abrangidas pela legislação do contrato individual de
trabalho e pela segurança social, tornam-se, por isso,
discriminatórias.
O surgimento destas novas formas de contrato limita a
estabilidade do emprego, tornando-o precário, reduzindo as
vantagens sociais e outras garantias de que desfruta o
trabalhador permanente, originando uma verdadeira segmentação
ou dualidade de mercado de trabalho: a par de trabalhadores que
dispõem de empregos estáveis e condições de trabalho normais
existem outros trabalhadores com empregos precários, e sujeitos
a condições de trabalho inferiores.
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